Séc. XIX: as invasões Francesas

Por Raul Manuel Coelho

No muito complexo processo social, filosófico e político decorrente da revolução francesa de 1789, inspirada pelas ideias iluministas, por vezes radicalizadas, em contexto de forte crise económica conjuntural, opondo-se-lhe em grande escala, visando a respetiva reversão, as antigas ideias e práticas, designadas de absolutismo monárquico, pretendida por muitos dos Reinos Europeus inconformados, surge, depois de 1794, a ação determinada, violenta, ambiciosa e quase implacável de Napoleão Bonaparte, o qual se tornaria, depois, em 1804, imperador dos franceses. Levava-se, assim, a guerra e a destruição, uma vez mais, a muitas partes da Europa.

Portugal viu-se também invadido pelos exércitos napoleónicos, por três vezes: em 1807, 1809 e 1810. Quando já em retirada, em 1811, parte das forças agressoras atravessaram a região das Cinco Vilas, causaram uma vaga de extremo terror, violência, assassínio, roubo e destruição.


Na região, os mortos foram na ordem das centenas, um quinto dos quais mulheres. Segundo estes dados, recolhidos junto dos Párocos, no Avelar mataram 14 homens e 8 mulheres, incluindo o Padre António Lopes, da Rapoula, o qual foi degolado.

Queimaram 2 lagares de azeite. Roubaram nas casas diversos bens de valor superior a 4000 cruzados. Causaram ainda os seguintes danos registados: 2.800 alqueires de milho, 450 alqueires de trigo, 160 alqueires de cevada, 90 alqueires de legumes e grãos de toda a qualidade, 40 Alqueires de azeite, 250 almudes de vinho, 2.000 cabeças de gado miúdo, 20 bois, 23 cavalgaduras, 300 arrobas de carne de porco, 800 galinhas.

Danificaram e furtaram a antiga Igreja matriz, junto ao pelourinho, com prejuízos superiores a outros 4000 cruzados, nomeadamente: uma grande cruz de prata, chamada a do povo, a custódia, o vaso do Santíssimo no Sacrário, um cálice, o relicário, tudo em prata, (que se achavam num caixão enterrado numa sepultura da igreja); queimaram 4 vestimentas e seus ornatos, 2 pontificais,12 frontais e 6 cortinas, campas das sepulturas, as grades da pia batismal, e parte da imagem do Divino Espírito Santo; quebraram: 3 Pedras de ara, o Sacrário, 2 lâmpadas, 1 cruz com o Senhor crucificado; e parte da tribuna; demoliram o altar-mor e os 2 colaterais;

Na Capela da Senhora da Guia demoliram o altar-mor, quebraram as pedras de ara dos 3 altares, laceraram um bom pontifical que custara 141.200 réis, roubaram a Coroa da Senhora da Guia, dinheiro, cordões, anéis, e outras alfaias, num custo estimado de 850.000 réis.

Nas capelas da Rapoula e de Santo António destruíram todos os seus ornamentos e levaram um cálice de prata.


Nos registos paroquiais do Avelar, na imagem, contam-se, ao tempo da passagem dos franceses, 17 óbitos, 10 dos quais mulheres. Nos registos da Aguda são identificadas, pelo menos, mais 6 pessoas pertencentes à Paróquia do Avelar, alguns destes com a indicação de terem sido mortos a tiro.

A situação de dificuldade em que os Avelarenses se acharam após este trágico acontecimento fica bem expresso no facto de, nesse ano, ao todo, se terem registado 65 óbitos, quando a média anual seria de 12. Os casamentos e os nascimentos diminuíram abruptamente. Há apenas o registo de um batismo em 1811, sendo 20 o número habitual por esse tempo.

Em 1815 Napoleão seria derrotado de vez. Porém, as ideias e os movimentos, que lhe eram anteriores, e dos quais se aproveitou despoticamente, perduraram, para o bem e para o mal, suscitando as mudanças que se seguiram, gradualmente, sobretudo nas sociedades ocidentais.